terça-feira, 20 de maio de 2008

A DESPEDIDA DE ZÉLIA GATTAI


A foto de Fadhul, o cão da família, fez companhia a Zélia Gattai, em seus últimos momentos. Agora, ele vai assistir a volta definitiva da dona à tradicional Casa do Rio Vermelho, onde as cinzas da escritora farão, para sempre, companhia ao marido Jorge Amado, no jardim. A cerimônia de cremação foi realizada no domingo à tarde, em uma das capelas do Cemitério Jardim da Saudade, no bairro de Brotas. A entrega das cinzas à família está prevista para hoje.

Zélia morreu no sábado, aos 91 anos. A decisão de reunir a mãe e seu amor foi dos filhos de Zélia e Jorge Amado, João Jorge e Paloma Amado, que passaram a noite velando o corpo da escritora, recebendo amigos, lembrando coisas e casos. Pouco antes do seu falecimento, Zélia foi retirada da UTI e transferida para um quarto, onde passou os últimos instantes em companhia de integrantes das família.

Ao conhecer e se casar com Jorge, tomou a decisão de mudar pra Bahia, fato presenciado - e musicado - por Dorival Caymmi, nos primeiros versos, feitos de improviso, em que o escritor confessa o amor por Zélia. Paloma, abalada, deixou transparecer a dor da perda, e lembrou a fé de Jorge e Zélia, manifesta em personagens deles, como Pedro Arcanjo, um bedel que desmitifica a pureza caucasiana na elite baiana.

“Eles não conheciam limites materiais, e sei que já estão de mãos dadas em seu jardim”, comentou, emocionada. Ao optar por acompanhar seu Amado, a então militante comunista, nascida em São Paulo e descendente de italianos, assumiu o trabalho de revisar e corrigir os textos de um dos baianos mais lidos.

O filho, João Jorge, nasceu em 47 no Rio, quando ainda era deputado pelo PCB, e a filha Paloma três anos depois em Praga, durante o exílio na Tchecoslováquia, quando o partido se tornou proscrito. Em respeito à mãe, e aos ritos religiosos, eles usaram branco. Maurício, amigo e veterinário de Fadhul, recorda a tristeza do cão ao vê-lo: “ele estava desolado”.

Paulistana, filha de imigrantes italianos, Zélia conheceu o futuro marido, Jorge Amado, em 1945. Em 1979, aos 63 anos de idade, Zélia estreou na literatura, lançando o livro “Anarquistas, Graças a Deus”, em que relatou histórias da família italiana.

A escritora ocupou a cadeira 23 da Academia Brasileira de Letras (ABL).

Memorial

Paloma e João Jorge, confirmaram a intenção de criar um memorial em homenagem a seus pais, na tradicional casa da família, no Rio Vermelho. O prefeito João Henrique Carneiro (PMDB-BA), uma das muitas personalidades políticas que estiveram no velório de Zélia, anunciou sua adesão à proposta e disse que criará uma comissão municipal para apoiar o projeto. O dia chuvoso em Salvador não impediu que centenas de políticos, intelectuais e populares comparecessem ao velório, todos lamentando a perda de Zélia e ressaltando o papel de destaque que ela e Jorge Amado ocuparam na cena cultural baiana e nacional. “Os que conviveram com Jorge e Zélia sentem muito a falta que eles fazem”, disse o artista plástico Mario Cravo Neto.

Zélia Gattai morreu em decorrência de falência múltipla de órgãos, pouco antes das 17h de sábado. Estava internada desde abril. A saúde da escritora piorou após uma cirurgia para remoção de uma obstrução no intestino, que desencadeou problemas pulmonares e renais.

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